terça-feira, 20 de maio de 2008

Meditações de um notívago


No dia 18 de março deste ano, recebi esta carta-email do meu pai. Fazia menos de um mês que havíamos viajado.
Na íntegra, segue:

"Levantei-me no meio da noite. A lua batia no mar com sua brancura, inerte, contrastando com a mobilidade das ondas. O mar, insondável, a separar povos, nações... A lua, pairando sobre tudo, numa banda do mundo, vigilante. A brisa marinha, de fora para dentro do mar, o “terral”, causava-me fadiga. Pensei como vocês estariam, do outro lado do mar, prestes a acordar, devido ao fuso horário. Eu, ainda teria muitas horas para ver a luz do sol, me despedindo da lua. As palhas dos coqueiros não davam sinal de vida ondulante: viçosas, mas imóveis. Pelas janelas, sem para-peito, começava, sem vento, um “toque-toque”, que pensei ser do ar condicionado do apartamento superior, cuja água cai sobre o meu ar condicionado e faz aquele barulho. Na verdade, era, mas também, de uma chuva que começava a dar seus sinais. Nem um apito do guarda noturno, que guarnece a área. Senti a fragilidade dos seres: àquela hora, quem poderia estar pensando em mim? Um insone, talvez, assim como eu, estaria acordado. Pensei na necessidade da amizade que muitas vezes desprezamos e meditei: um inimigo, acordado a esta hora, poderia também pensar em mim. Como não o tenho, só poderia apelar para um amigo acordado. Porém, não seria justo desejar que um amigo fosse puxado na madrugada para voltar seu pensar para mim. Pensei, mais uma vez, em vocês: acordariam daqui a pouco e não seria injusto o desejo de puxá-los para meu mundo, acordariam naturalmente. Nesse acordar, poderiam voltar o pensamento pr´as coisas distantes, atravessando a amplidão do mar e pousar ali, naquele coqueiro, em frente ao apartamento. Depois, pensamento, como veio, voltou a se concentrar em outros e coisas diversas, mas já tinha invadido o meu universo. Dei de olho no canto da parede: a bicicleta de Iago, ainda não consertada. O tempo continua a girar e os encontros e desencontros serão sempre uma constante na natureza e, na natureza humana, a duração de cada vida. Liguei a televisão, embalado neste pensamento, voltei a dormir. Vocês acordaram e eu, dormindo; com vocês, só poderei sonhar. Acordei e reli o escrito. Não achei grande coisa, mas à mingua de algo melhor, envio-o. Com um piparote no teclado do computador, me despeço. Um abraço a todos. Amanhã em Abreu e Lima é feriado. Prejuízo pr´a mim, na certa. Mas, que tem a vida de feia? Ela é sempre bela!"

A estrangeira finaliza: Que saudade!! Segue a música que ele cantava para mim, na infância. Imitei-o e canto para meu filho Iago hoje, e é uma de suas preferidas (Prece ao Vento).
http://br.youtube.com/watch?v=FTWFvILrYzU